Quase nunca pensamos no oxigênio que nos permite respirar. É algo natural, presente em nosso existir desde sempre. Não emprestamos a ele o valor que tem. Assim também, só amos a considerar a importância da mãe, quando a perdemos.
Enquanto a temos, contamos com o seu ilimitado amor. Evidenciado de todas as formas. Os cuidados mais singelos – “agasalhe-se, filho! Você já comeu? Não volte tarde!” – aos testemunhos mais sérios de sua onipresença. Estar ao seu lado antes e após as cirurgias, medindo sua temperatura com a mão carinhosa que segura a nossa. E que largamos assim que percebemos, para não parecer piegas.
A mãe é a cuidadora. A zeladora de nossa memória. A guardiã de nosso tesouro afetivo.
Quer agradá-la é elogiar seu filho! Quer ofendê-la é fazer a menor menção a uma falha que nele se enxergue.
Quem é capaz de vibrar com a vitória alheia, a não ser a mãe? Quem é que sofre com a dor alheia, a não ser a mãe?
O único amor ilimitado, infinito, incondicional, inexplicável e, no entanto, concreto, é o amor materno. É verdade o que a poesia já exprimiu: ser mãe é desdobrar, fibra por fibra o coração. É mais ainda: é aceitar o mergulho no inferno, se for para buscar o filho.
A maneira mais eficiente para se mostrar o que significa o afeto do Criador em relação às criaturas, é dizer à criança que Deus nos ama como nossa mãe nos ama. O antropocentrismo tradicional prefere falar em Pai. Mas o amor da mãe é diferente. É mais entranhado. É aquilo que nos envolve, nos impregna, de tal forma que nem sempre sabemos corresponder, tamanha a intensidade.
Quanta vez não repeli o carinho físico de minha mãe, que queria me abraçar, me beijar, ficar de mãos dadas. E eu não sabia corresponder. Achava excessivo. Só agora lamento a ausência do contato corporal que desprezei. Agora, que sei que nunca mais – nunca mais – vou poder beijar suas mãos, deitar em seu colo, entregar-me àquela generosa entrega, sinto o gosto amargo da ausência e do remorso. Adulto e experiente, como não dei valor a essa intimidade cuja falta tanto me angustia? Saí de suas entranhas. O vínculo entre nós é tangível e concreto. Um tolo respeito humano me fez renunciar ao usufruto de algo que nunca mais terei.
Lições de vida não se transmitem. Cada qual trilhará o seu percurso de maneira inconfundível. Mas se eu pudesse falar ao coração filial de alguém disposto a me ouvir, eu diria: aproveite cada instante ao lado de sua mãe. Ouça o que ela tem a dizer. Não cometa o pecado mortal de dizer que ela já falou aquilo. Que ela está a se repetir. Que você já sabe o que ela vai dizer.
Penitencio-me de agir assim e de ouvir sua serena oestação: - “Se você tivesse aprendido o que eu ensinei, sua resposta seria: Pois não, mamãe! Sou todo ouvidos! Diga para mim o que quer contar!”.
Aceite a efusão, que está no DNA das mães. Elas querem tocar os filhos. Querem senti-los. Querem transmitir carinho. Cada vez que a mãe beija seu filho, abraça-o, segura suas mãos, está abençoando a cria. Essa é a mais valiosa bênção que se pode receber. Nela só há generosidade, a firme e imensa vontade de que tudo dê certo, de que os males se afastem, de que, se tiverem de acontecer, que o alvo seja ela, não seu filho!
Sirvo-me de um chavão para me solidarizar com quem perde sua mãe. “Quem tem mãe, tem tudo! Quem não tem mãe, não tem nada!”. Convenço-me de que isso é real. Sem mãe, estou sozinho na jornada. Resta sonhar que a peregrinação não encerra esta aventura. E que um dia possa reencontrar aquela que me amou mais do que tudo e compensar o que lhe não dei, cobrindo-a de beijos. Será que isso é possível?
José Renato Nalini é reitor, docente de pós-graduação e Secretário-Executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo ([email protected])