ARTIGO

Sexualidade e Religião (2-3)

Por Luiz Xavier |
| Tempo de leitura: 3 min

A maioria dos teóricos afirma que a religião surgiu entre os seres humanos com duas finalidades: explicar o mundo e dar um sentido à vida de cada pessoa. Para qualquer uma dessas finalidades, a religião vai lidar com os mistérios da vida. Toda religião pretende responder a pelo menos duas das questões irrespondíveis que os seres humanos se fazem desde sempre: 'de onde eu vim?' e 'para onde eu vou'. Digo que toda religião pretende responder a essas questões porque na verdade elas são irrespondíveis se apelamos apenas à racionalidade, podendo ser elucidadas somente pela fé. Por exemplo, ninguém até hoje provou a existência de um céu (ou de um inferno, ou de uma outra vida) após a morte, de maneira que só se pode ter fé nele. Para os que creem, o céu é uma certeza, mas uma certeza baseada na fé e não em um raciocínio lógico, formal e científico.

A sexualidade humana é cheia de mistérios, dentre os quais pode-se destacar, por exemplo, que é através dela que a vida se reproduz e se perpetua. Em outros termos, é que cada ser humano traz inerente a si a semente da vida e é capaz de ser, por isso, um agente criador de vida, uma fagulha de Deus. É por causa dos tantos mistérios que estão associados à sexualidade que ela faz uma interface com a religião, notadamente no que diz respeito ao sentido da vida.

Para outros teóricos o que gera a interface entre a religião e a sexualidade é de outra ordem que não o mistério. Para eles, uma das principais funções da religião é dar aos seres humanos normas sobre a vida, regras, leis sobre como deve ser o comportamento das pessoas. A imensa maioria de nossos costumes tem uma origem em alguma lei religiosa, em algum código moral estabelecido por alguma religião em algum momento da história da humanidade. Não fosse o controle e a regulamentação que as religiões fizeram sobre os instintos humanos, muito provavelmente a vida em sociedade não seria possível, ao menos da forma como a conhecemos.

O ser humano é um dos animais que se reproduzem através do sexo. Como todos os outros animais que têm essa característica, é muito provável que a princípio os humanos tivessem um comportamento sexual determinado pela natureza, principalmente no que diz respeito a códigos de escolha de parcerias e de acasalamento. Como acontece com todos os outros animais, é muito provável que a princípio houvesse muita violência associada à sexualidade humana, uma violência que precisava ser contida para que pudesse haver a vida em sociedade. Certamente a maneira mais eficaz de se fazer essa contenção é através de códigos impostos aos seres humanos por alguma entidade sobrenatural. É assim que surgem as leis religiosas que incidem sobre a sexualidade, sendo que provavelmente a primeira delas foi a que impedia o incesto e obrigava os homens a buscarem parcerias fora de sua família.

Todas as religiões são constituídas por um sistema de crenças (a maneira de a fé se expressar), sistemas de ética (as leis que regulam e orientam o comportamento humano) e sistemas de organização (a maneira como a instituição religiosa vai se hierarquizar).

Pelo que vimos até aqui, então, podemos entender as relações entre a sexualidade humana e a religião se dando principalmente através de duas vias, uma que fala dos mistérios associados à sexualidade e à religião e outra que trata da função socializadora da religião. Uma, a primeira via, se aproxima mais da questão do sentido da vida, dos 'para que' da existência humana; a outra via fica mais perto da questão da explicação do mundo, na qual se inclui os 'como' da vida, isto é como deve ser exercida a graça da vida, mais especificamente no nosso caso, como deve ser exercida a sexualidade humana.

Luiz Xavier é Psicólogo Clínico, Terapeuta Sexual e Terapeuta de Casais.

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